Reforma Protestante: Uma Mudança Histórica no Cristianismo

Reforma Protestante — Às vezes, ficamos perplexos ao saber que a Igreja amada de Cristo, aquela que Jesus morreu por ela, desceu ao mais baixo nível espiritual. E lá, morrendo lentamente, mergulhou na escuridão do abismo, conhecida e responsabilizada pela mancha deixada pela nomenclatura “período das trevas”.

Eis aí a razão de Nietzsche, filósofo alemão, decretar impiedosamente a “morte de Deus”. Deus está morto, gritou Friedrich Nietzsche. Não queremos este Deus, bradou ele. A sombra da religião que assombrou a Europa por longos anos está indo embora. Este Deus cruel e carrasco que julga, condena e pune, está “morto”.

Como entender Nietzsche? Será que ele tinha razão? E você? Caro amigo leitor, aceitaria este Cristo apresentado pela Igreja Romana?  Se estas perguntas afligem a sua alma, amigo leitor, então, você está no lugar certo.

Reforma Protestante

Neste Artigo analisaremos sob as lentes da Teologia o período que antecedeu a reforma protestante, também, discorrer sobre as causas do declínio da Igreja. Caminharemos desprendidos de interesses pessoais ou ideológicos como o fazem aqueles que avaliam o período com as lentes do catolicismo romano.

O Contexto Histórico

A Reforma Protestante foi um movimento que surgiu no século XVI, liderado por Martinho Lutero, cujo objetivo era reformar a Igreja Católica. Esse movimento marcou uma mudança significativa na história do cristianismo e teve um impacto duradouro na religião, na política e na cultura em todo o mundo.

Para os leigos em História da Igreja, Martinho Lutero foi um louco que tinha pulsões sexuais e se revoltou contra a igreja porque queria casar. Sob suas lentes, a Reforma Protestante foi um erro. Segundo eles, todas as prisões, torturas e mortes foram necessárias e justificáveis.

Diante de tal cenário e a procura de algo que faça sentido a instalação da reforma. Para evitar que a história se repita e tantas vidas sejam ceifadas por fanáticos religiosos.  Para apontar psicopatas e sociopatas com mentes e pensamentos adoecidos por ideologias.  

Este artigo ganha relevância à medida que impele o leitor a embarcar numa jornada de pesquisas que confirmam os abusos e os crimes praticados contra a humanidade. Para espanto de qualquer ser racional, estes desvarios aconteceram em nome de Deus.

O MUNDO ANTES DA REFORMA PROTESTANTE

Erasmo em 1536 retrata aquele período: “Pior século desde Jesus Cristo”

Idade Média: Período das Trevas

Cenário histórico: declínio, desintegração, decadência, adversidade e instabilidade.

Declínio: a sociedade medieval estava num processo de descida rumo ao abismo, nada via que interrompesse essa queda. A Reforma Protestante não serviu apenas de freio para desacelerar o declínio, mas, também, para reverter e reiniciar a subida.

Desintegração: trata-se de uma sociedade que entrou em decomposição. Perdeu sua unidade e viviam em dois mundos simultâneos. O mundo luxuoso do clero com suas catedrais góticas e o mundo sofrido dos miseráveis.

Decadência: estado do que está começando a se degradar e caminha rapidamente para o fim, para ruína.

Adversidade: desgosto, angustia, aflição, amargura, desprazer, desolação, contratempo. Ah! Caro amigo leitor, não faltam adjetivos para descrever as expectativas e emoções dos viventes desta época.

Instabilidade: incertezas sobre o que aconteceria no amanhã. Ansiedade constante e falta de segurança, agiam com desânimo e melancolia sob os desmandos do papado.

SOFRIMENTO, DOENÇAS, FOME E MORTE

Um desassossego mórbido com sofrimento e morte impregnou a Europa na Idade Média. No início do século XIV, a crise agrária era tão intensa, que alguns recorreram ao canibalismo para matar a fome. Cadáveres de criminosos eram tirados das forcas e comidos pelos pobres na Polonia e na Silésia. Thimothy George, Teologia dos Reformadores, página 26.

Acrescente-se a tal catástrofe a destruição provocada pela peste bubônica, ou peste-negra, que atingiu seu ápice na Inglaterra por volta de 1349 e arrasou pelo menos um terço da população da Europa.

AMBIENTE DE TERROR — TERRA DE NINGUÉM

Reforma Protestante

A palavra “trevas” descreve o período de horror e amplia a visão caótica da época. Uma nuvem escura da religião entristecia e acabava com as esperanças, até mesmo dos mais otimistas.

Pessoas eram alienadas, conduzidas e atormentadas pelo medo da morte e do inferno. Sensação de mal-estar, inquietação profunda e o peso da culpa levavam as pessoas ao flagelo. As marcas do pecado e a falta de dinheiro para pagar indulgências eram motivos para o desespero.

Penitências absurdas eram recorrentes, terminavam com a exaustão do corpo cortado por lâminas amarradas nas pontas de pedações de ossos.

Aquele Cristo oferecido pela igreja católica romana não era o Jesus da Bíblia. Era um deus cruel e carrasco, que julgava, condenava e matava. O vazio da alma e a falta de sentido da vida eram parceiros na calada das noites de insônia.

Esta terrível situação atormentava Martinho Lutero, gritava com voz estridente: “onde posso encontrar um Deus gracioso?” Amedrontado e com sensação de culpa sem fim, eram motivos para ele torturar seu corpo, mendigando o perdão de Deus.

Terrores noturnos assolavam sua alma, medo de morrer e ter seu destino nas mãos do papa. Para aonde irei? Céu, inferno ou purgatório? Tinha que obedecer aos desmandos e a opressão da igreja para ter favores depois da morte. Ah! Que situação, caro amigo leitor! Lutero estava num barco a deriva. Eis a pergunta que não cessava de lhe perturbar e inquietar o coração: “onde encontrar um Deus misericordioso?”

REFORMA PROTESTANTE — BRILHA UMA LUZ

Reforma Protestante

Foi movido pela angústia e incertezas que Lutero começou a estudar a Bíblia no mosteiro em que ele estava enclausurado. A leitura da Bíblia era proibida aos leigos. Todavia, sendo ele um monge, tinha o privilégio de ler sem restrições.

A Palavra de Deus é eficaz, diz o autor da carta aos hebreus. Ela não volta vazia, registrou Isaías. Ao ler a carta aos romanos, Martinho Lutero foi tocado fortemente pela Palavra:

“Porque nele se descobre a justiça de Deus de fé em fé, como está escrito: mas o justo viverá pela fé.” Romanos 1:17

Estas palavras penetraram no fundo da alma e ele logo percebeu que seus olhos se abriram. Seus medos, angustias e temores se dissiparam, um novo mundo com novos horizontes se abriram diante da nova descoberta.

Lutero encontrou o sentido mais amplo das palavras de Jesus

“A fé vem pelo ouvir a Palavra de Deus”. Romanos 10:17

A primeira coisa que as religiões fazem para manipular e dominar pessoas é proibir a leitura e o estudo da Bíblia. A letra mata é seu jargão preferido. Mantê-las na ignorância e no analfabetismo bíblico é a condição necessária para a alienação, opressão, e, por fim, extorquir seus bens e suas alegrias.

AMBIENTE POLITICO — Reforma Protestante

Os papas possuíam duplo poder, temporal-político e religioso. Com o poder temporal mandava e desmandava nos reis. Cobrava altos impostos para manter a vida luxuosa do clero.

O poder espiritual concedia-lhes plenos poderes nos céus e na terra. Cobrava indulgências em troca de perdão de pecados, também, garantir que o fiel não torrasse no inferno por toda a eternidade.

Lutero declarou que a igreja era o braço direito de Deus e a política o esquerdo. A única certeza era que a Europa estava explodindo em ódio contra o papado. Ninguém aguentava mais, o mundo clamava por uma Reforma Protestante.

Lutero desferiu palavras fortíssimas contra o papa

“Denunciou o papa como anticristo, referiu-se à hierarquia da igreja romana como ‘prostituta do diabo’, queimou o tratado inteiro da lei canônica, como também a bula papal que o havia excomungado”. Thimothy George, Teologia dos Reformadores, página 87

Quando se analisa a posição de Lutero sobre o papa, percebe-se que ele foi generoso em face aos outros reformadores. Veja o que diz Wycliffe:

“Ele denunciou os sacerdotes de ladrões, raposas malignas, glutões, demônios, macacos e os curas de rebentos estranhos, não arraigados à vinha da igreja. O papa era o ‘vigário principal do demônio’, e os mosteiros ‘antros de ladrões’, ninho de serpentes, lares de demônios vivos. Thimothy George, Teologia dos Reformadores, página 38

CORRUPÇÃO DO CLERO

Autoridade sacerdotal exagerada, abuso de poder, avareza e acúmulo de riquezas eram apenas alguns desvarios desta época. Na contramão da vida do Cristo bíblico: Jesus lhe respondeu: “As raposas têm suas tocas e as aves dos céus têm seus ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça”. Mateus 8:20

A igreja romana acumulou tanta riqueza que pouco sobrava para os outros suprirem suas necessidades básicas. Ela se tornou a maior latifundiária de terras do planeta. O clero participava e se beneficiava delas para viver uma vida narcisista e maligna. Os clérigos tornaram-se egoístas e indiferentes em face à dor alheia.

Eram grandes privilegiados pelas riquezas que, embora social e legal, no entanto, imoral e desproporcional. Alguns chegavam ao ponto de acumular vários cargos eclesiásticos para arrecadar mais e aumentar suas rendas.

A Simonia (venda de cargos eclesiásticos) era prática comum e rotineira entre os padres. Vendiam para arrecadar e não faltavam compradores, haja vista, ser um negócio rentável e de retorno rápido.

Imoralidade generalizada, embriaguez, imoralidade sexual e glutonaria eram comuns e praticados entre os religiosos.

PROVANDO DO PRÓPRIO VENENO

A ganância dos religiosos era tamanha que tiveram de provar do próprio veneno. Ao acumular riquezas e abandonar o povo, criaram seu próprio coveiro. A lógica da vida não falha, os países de primeiro mundo compreenderam isto. Possuem um sistema de distribuição de renda justa para que todos tenham para suprir suas necessidades.

A lógica é a seguinte: se uma parte da sociedade acumula muito e deixa os outros sem nada. Então, quem não tem nada se revolta contra quem tem. As sociedades modernas sofrem com isto, acumulam muitos bens sem poder usufruir deles em paz e segurança. Quem não tem nada rouba, sequestra e mata quem tem.

Martinho Lutero ascendeu o pavio que foi o estopim da Reforma Protestante. Ele quebrou o sistema de arrecadação da igreja ao propagar a ideia de que ninguém mais precisava pagar pelos perdões de pecados. Pagar pelas indulgências não era mais necessário, a salvação vem somente pela fé.

A Reforma Protestante não abalou apenas a unidade da igreja medieval, mas, também detonou os alicerces financeiros e toda estrutura de autoridade e abusos. Quebrou os poderes divinos que os papas reivindicavam ter.

A revolta generalizada do povo abandonado foi inevitável. Protestos e gritos insistentes decretando o fim da igreja corrupta se ouviam em todos os lugares. Todos gritavam em coro e na mesma voz, o mundo clamava por uma Reforma Protestante.

Inquietação social, ódio aos sacerdotes devido às explorações e extorsões de dinheiro, indiferença com o estado deplorável do povo e a recusa dos padres em fazer algo para libertar as classes oprimidas. Em decorrência disto, os protestos tornaram-se mais frequentes e mais violentos. Era o começo do fim dos momentos de ouro da igreja corrupta.

CAUSAS

Quais foram as causas que levaram a igreja cair neste abismo?

Primeira causa: Entendimento de que a Igreja criou a Bíblia.

Talvez, este seja o maior e o mais destrutivo erro da Igreja Romana. Este equivoco escancarou as portas para entrada de sucessivos erros teológicos que levou a Igreja de Cristo ao fundo do poço da imoralidade, ganância, corrupção e apostasia.

Se a Bíblia é subordinada a igreja, então, ela perde a autoridade primaria para dar lugar aos desejos obstinados do homem.  Eis aí a razão da tradição católica ganhar lugar de destaque na composição eclesiástica.

A Bíblia orienta e molda o homem conforme a vontade soberana de Deus, mas, quando deixada de lado os caprichos humanos afloram e os resultados levam ao egoísmo, egocentrismo, ganância, avareza e, por fim, a depravação total.

Por ser de cunho religioso, apresentaremos os resultados, também, relacionados a fé e a vida eclesiástica dos religiosos. O padre, pastor ou líder, cuja, responsabilidade de conduzir o rebanho, transforma num ambiente de exploração constante.

Este erro da igreja medieval persiste e acompanha uma parte dos próprios protestantes. Protestaram e hoje são passiveis de protestos e repreensão.

CONSEQUÊNCIAS

  • O religioso pensa ser justo e com super poderes, todos os demais são inferiores a ele. Exemplos: a palavra “papa” pai, ou seja, um homem se posicionou como pai da humanidade:

“A ninguém chameis de pai”. Mateus 23:9

  • Pensa ter posição privilegiada ou crédito com Deus. Inclusive, no meio pentecostal usa-se de forma repetida por alguns pregadores o seguinte jargão: “Deus, se tenho crédito contigo…”
  • Sentimento de superioridade: se eu sou superior a você, então, eu posso te julgar e condenar. A sua miséria não me comove no meu luxo. Dois mundos simultâneos aparecem: mundo luxuoso do clero e o da miséria e da fome do povo.

Dois textos na carta aos Romanos se cruzam e conflitam entre si quando não entendidos no seu contexto: “…está escrito: Mas o justo viverá pela fé.”
Romanos 1:17

“Como está escrito: Não há um justo, nem um sequer.” Romanos 3:10

Como entender estes versículos? Podemos entender a luz do contexto de Romanos 1:17. Eis aí o versículo completo:

“Porque nele se descobre a justiça de Deus de fé em fé, como está escrito: Mas o justo viverá pela fé.”
Romanos 1:17

Aqui todo conceito de justiça do homem cai por terra. Romanos 3:10 afirma não haver um justo sequer. Há um nivelamento entre todos, ninguém é superior a ninguém. Nem papa, nem padre, bispo ou pastor, todos estamos debaixo do pecado, como afirma o apóstolo Paulo.

Nem os dons trazem superioridade, quem tem dom de cura, também, fica doente. O possuidor do dom de profecia, também, tem pecados ocultos. Nas entrelinhas de Romanos o orgulho cai e a arrogância vai embora.

Então, qual é o sentido de, o justo viverá pela fé, se não há um justo sequer?  A resposta é, como humano sou pecador e não sou justo. Como salvo, sou justo porque sou justificado nEle. Sendo justificado não devo mais nada.

Nele, Jesus, repousa todo mérito, poder e justiça. Em nós, paira apenas a submissão a Ele e o reconhecimento de que somos todos iguais.

CONCLUSÃO — Reforma Protestante

A Reforma Protestante levou consigo aquela nuvem negra da religiosidade. No entanto, esta nuvem insiste em voltar para nos aterrorizar. A sutileza da alienação e exploração do povo continua a mesma. Com agravante do uso de instrumentos de propagação de altíssima velocidade, a internet.

Na busca de um alívio para suas mazelas e dores, as massas manipuladas e sofridas. Submetem-se e cedem as tentações das ofertas e promessas de enriquecimento rápido, curas milagrosas e vida fácil.

A igreja precisa voltar urgentemente as suas origens. Todos aqueles que se dizem cristãos, deveriam ler e aplicar o Sermão do Monte proferido com tanto entusiasmo pelo Senhor Jesus. Amar o próximo, dar a outra face, caminhar a segunda milha, orar pelos inimigos. Isto é o mínimo que se espera de uma Igreja que se diz cristã.

O Mundo não precisa de Religião, precisa de Jesus e de seus ensinamentos. Não aceite nada menos que isto, proteste, critique e haja para que os opressores sejam descobertos e denunciados. O silêncio dos bons é combustível para o sucesso dos maus.

Para não alongar muito este Artigo sobre a Reforma Protestante, omitimos os julgamentos, torturas, masmorras e equipamentos que levaram milhares de pessoas a morte.

Eis aqui algumas palavras-chave para serem lembradas: fanatismo religioso, mal-estar, inquietação profunda, ansiedade, peso da culpa, terrores noturnos — insônia, medo da morte e do inferno, excomungado, etc.

Para ampliar seus conhecimentos veja também:

Noventa e cinco Teses de Martinho Lutero

Youtube

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ADILSON CARDOSO

Adilson Cardoso: Teólogo, Filósofo — Professor de Filosofia, Teologia, Hebraico e Grego.

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